Capitalismo de vigilância e racismo

o reconhecimento facial automatizado como técnica de controle sobre o corpo negro

  • Bruna Azavedo de Castro Faculdades Londrina, Londrina, PR, Brasil
  • Katie Silene Cáceres Arguello Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil
  • Tatiana Moraes Cosate Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil

Resumen

Imerso em uma sociedade de vigilância, o ser humano constitui fonte e usuário da coleta, processamento e análise dos seus dados digitais, perfazendo a modulação das subjetividades humanas. Permeado pelo discurso em que se glorifica as novas e mais modernas tecnologias, o já conhecido e inebriante discurso de combate à criminalidade violenta (ideologia da segurança pública), ganha novos instrumentos e técnicas de trabalho. Dentre esses instrumentos, destaca-se a utilização do reconhecimento facial automatizado. Este se concretiza através da coleta dos dados biométricos da face humana, conferindo um tratamento mais objetivo, supostamente neutro e eficaz no cumprimento de mandados de prisão. Nesse contexto, o presente artigo tem por objetivo debater o reconhecimento facial como uma técnica de controle e construção de subjetividades no sistema penal, que reforça sua seletividade. Para responder a essa problematização, analisamos a monitoração facial como uma nova forma de controle (digital) que circunda as relações pessoais. Identificamos um viés racista e discriminatório dos algoritmos utilizados, descortinando a suposta neutralidade atribuída a essas novas tecnologias. Utiliza-se a pesquisa bibliográfica, documental e estatística.

Biografía del autor/a

Bruna Azavedo de Castro, Faculdades Londrina, Londrina, PR, Brasil

Doutora em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo. Mestra em Direito Penal pela Universidade Estadual de Maringá - área de concentração: tutela de interesses supraindividuais. Possui graduação em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (2005). Especialização em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Estadual de Londrina (2006-2007).. Bolsista da CAPES (2007 a 2008). Professora de Direito Penal nas Faculdades Londrina (Londrina -PR) e Centro Integrado Universitário de Campo Mourão (Campo Mourão - PR).

Katie Silene Cáceres Arguello, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil

Doutora pelo Departamento de Antrhropologie et Sociologie du Politique - Université Paris 8 - Vincennes-Saint-Denis . Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Professora da Graduação e da Pós-graduação em Direito da UFPR. Membro do Instituto de Criminologia e Política Criminal (ICPC/PR); associada do Instituto Carioca de Criminologia (ICC/RJ). Coordenadora do Núcleo de Criminologia e Política Criminal (PPGD/UFPR) e do Grupo de Estudos em Criminologia Crítica (CNPq).

Tatiana Moraes Cosate, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil

Professora de Graduação e Pós-graduação em Direito Penal, Processo Penal e Criminologia. Doutoranda em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Ciência Jurídica pela Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP). Especialista em Direito e Processo Penal pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Graduada em Direito pela Universidade Norte do Paraná (UNOPAR). Graduada em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade Estadual de Londrina (UEL).

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Publicado
12/03/2023