O conceito de realidade e sua relação com o problema da educação:
rudimentos filosóficos para não-filósofos
Resumo
Freqüentemente nos perguntamos sobre o que “realmente” aconteceu num fato noticiado ou “se é mesmo real” a existência de
vida pós-morte, ou ainda sobre a “realidade” de uma determinada proposta, querendo dizer se é ou não viável. Tais questões
pressupõem que temos uma perfeita e unívoca compreensão do significado do termo realidade. Contudo, quanto mais lidamos com expressões cotidianamente usadas, menos sabemos o que significam. Se, antes de nos perguntarmos sobre a realidade desta coisa ou daquele fato, nos questionarmos sobre o que é “real”, o que é “realidade”, a resposta possivelmente seria precedida de um enorme silêncio, e ainda seria uma resposta que não convenceria nem a nós mesmos. Normalmente consideramos que a palavra realidade significa “as coisas como elas são”, independente das nossas posições subjetivas. Isto porque é fácil aceitar a idéia de que a palavra real vem de res, “a coisa”, ou como concebe Duns Scoto, a individualidade, a coisa em particular. Nesse sentido, realidade refere-se somente ao “mundo externo”, independente da subjetividade humana, apenas como uma indicação da natureza das coisas, não das pesssoas. Antes de a Escolástica tardia cunhar a palavra realitas, o problema da realidade já era discutido desde a Grécia clássica, enquanto corporeidade (ousia), ou enquanto natureza das coisas (physis), ou mesmo como a verdade (alétheia) do ser (ontos). Desde Parmênides de Eléia (540-470 a.C.) se tornou comum no pensamento grego a distinção entre mundo sensível e mundo inteligível. Dessa distinção surgiu a pergunta pela “verdadeira realidade” ou o “verdadeiro ser das coisas”, uma vez que o mundo sensível é cheio de ilusões e de enganos. Tanto para Parmênides, quanto para Platão, a “realidade” está mais próxima do mundo ideal que do mundo sensível. De fato, esse termo merece um pouco mais de consideração, dado o fato óbvio, segundo o qual o mundo físico, o mundo das sensações, somente pode ser entendido a partir das idéias que fazemos dele. Quando tentamos buscar uma realidade independente dos nossos pensamentos, constatamos que aquilo que chamamos de “real” nada mais é que aquilo que “pensamos ser real”. Nosso propósito será aqui o de discutir noções básicas do conceito de realidade, uma vez que, numa prática educativa, a ordem é “partir da realidade do educando”, e depois transmitir a ele idéias e valores. A pergunta, portanto, fica formulada assim: o que é precisamente “realidade”, seja do ponto de vista da educação, do educador, seja do ponto de vista do educando? Qual é realmente o ponto de partida de uma proposta educacional? Que tipo de realidade a educação quer alcançar?